sexta-feira, 25 de abril de 2008

O Ovo da Baleia

Era 1991.
Véspera de ECO 92. O movimento ambientalista fervilhava.
Eventos de todos os tipos aconteciam por todos os lados. Muito papo furado também.

Eu cursava especialização em Engenharia Ambiental. Esse curso era um marco por ser o primeiro do genero no RJ e por ser coordenado pelo Haroldo de Mattos. Haroldo era o representante do Brasil no PNUD e depois PNUMA, lá em Nairóbi, entre outras coisas. Chique pacas.

No dia da aula inaugural Haroldo armou o maior evento. Colocou os 60 alunos do curso num auditório legal, mandou todos irmos bem vestidos (inclusive os PTelhos), organizou um baita coquetel. Todos os professores presentes, alguns convidados, etc...

O convidado especial que daria a aula era o Secretário de Meio Ambiente do Estado do RIo de Janeiro.
Apresentações, rasgação de seda, você é o maior, quanta honra estar aqui, palmas e mais palmas.
O tema foi, obviamente, a despoluição da Baía de Guanabara, que naquela época ainda se tinha a ilusão que iria acontecer.

E começa a aula. Blá, blá blá e sujeito solta a primeira grande pérola do dia:

-A Baía de Guanabara é extremamente importante pois, entre outras coisas, é o local onde o Rio Paraíba do Sul desagua.

Os alunos se olharam uns aos outros, Haroldão empalideceu um pouco e deu uma leve afundada na cadeira.

E o ilmo., não satisfeito, continuou:

-Outra grande importancia da Baía de Guanabara é que, em outros tempos, era local de desova das baleias.
-No século passado várias espécies de baleias vinham desovar na baía por ser sua rota de migração.

CARALHO!!! pensei eu!! As baleias podiam fazer tudo na Baía de Guanabara menos BOTAR OVO!!!

Silêncio total na sala. Haroldo tinha totalmente afundado na cadeira e
estava com palidez cadavérica. Com o prosseguimento da palestra e como ninguém se manifestou, Haroldo foi recobrando a cor, até que o ilmo abriu para as perguntas. Ai deu-se o estrago.

Um aluno chamado Amaral, que trabalhava em Furnas, fez a seguinte
consideração:

-Sr. Fulano, quero lhe agradecer pela magnífica palestra e por ter-me
aberto muito os horizontes. Agora realmente entendo a importancia da Baia e seu Projeto de despoluição. Espero que a Baia seja totalmente despoluida o mais rápido possível e que as baleias voltem logo a desovar nela, só assim podemos fazer omeletes de ovos de baleias que certamente, pelo tamanho acabarão com a fome de muita gente.

Ai não deu pra segurar
QUAQUAQUAQUAQUAQUA!!!

O coquetel terminou sem maiores incidentes.

No dia seguinte, primeiro dia de aula normal, é claro que o assunto era como poderiam ser feitos os omeletes de ovos de baleia e por ai vai.

Esse assunto foi de tamanha importância para a turma que a integração dos alunos foi imediata e logo foi criada a Fundação Ovo da Baleia, uma
instituição tipo ONG Tabajara.

Com o tempo A Fundação Ovo da Baleia passou a atuar em diferentes campos: primeiro a promoção de eventos sócio-etilico culturais, visitas e excursões diversas e brigas de todos os tipos com a direção do curso.

Os eventos sócio-etilico culturais incluíam churrascos mensais, chopp
semanal no Bar do Luiz, festas a fantasia, dia das bruxas, bagunças
variadas, gafieira, boites, enfim tudo que inclui farra. Foram consumidos litros e litros de cerveja sob patrocínio do Ovo da Baleia.

O curso não previa trabalho de campo e excursões, o que era uma grande falha. Um curso desses não pode ser feito sem levar seus alunos para ver na prática o que ensinam na sala de aula. Para suprir essa enorme deficiência, a Fundação Ovo da Baleia conseguiu realizar um grande número de excursões e visitas. Chegávamos nos locais e éramos recebidos não como alunos de um curso de especialização da UFRJ, mas sim como os integrantes da Fundação Ovo da Baleia. Visitamos a Usina Nuclear de Angra dos Reis, a Bayer, uma mineradora, a usina de Ribeirão das Lajes, a Texaco, a Shell, a refinaria de Duque de Caxias (Reduc), só pra citar as que eu me lembro. Isso tudo sem que a direção do curso ajudasse em absolutamente nada.

Por fim, pra desespero do Haroldo, a Fundação Ovo da Baleia assumiu para si todas as brigas e reivindicações dos alunos. Conseguiu que o local da sala de aula fosse mudado, que as mensalidades fossem congeladas, que os banheiros fossem limpos antes das aulas começarem e que alguns professores muito ruins fossem trocados. Conseguiu inclusive que as excursões feitas fossem contabilizadas como atividade oficial do curso. O curso durava o ano todo, mas depois dos primeiros 4 meses o coordenador geral (Haroldo) e o vice-coordenador (Kassim) não mais apareciam por lá. Sabiam que iam levar chumbo grosso.

Para fazer a integração geral e levar a informação a todos, a Fundação editava a Gazeta do Ovo, jornal diário que trazia as noticias e divulgação dos eventos e a Ovo da Baleia Gossips, revista lustrada mensal trazendo todas as fofocas, segredos e baixarias sortidas. Tinha também o Omeletão Diário, publicação semanal ao estilo Casseta e Planeta. (reparem: a publicação era semanal, apesar do nome)

Lá pelo final do ano, nossa Fundação estava tão famosa, e a burrice do "Emérito Energúmeno" tão comentada e difundida que nas palestras e eventos e íamos ouvíamos pessoas desconhecidas contando nossa história.

Tenho o maior orgulho de ter sido sócia fundadora da Fundação do Ovo da Baleia e redatora de suas publicações. Além de ter participado de todos seus
eventos.

[25 de abril de 2008]

2 comentários:

Unknown disse...

Olá, eu tb fui desta turma, vamos fazer 2o anos!!!

Luiza B disse...

A desova das baleias foi triste... Mas pelo menos deu para fazer toda essa bagunça ;)